Os nove diretores do Banco Central se reúnem nos dias 30 e 31 de julho para discutir o que farão com a taxa básica de juros do país. É quase unanimidade no mercado que o Comitê de Política Monetária (Copom) vai manter a Selic em 10,5% ao ano, como fez no último encontro do mês passado.
Mais do que isso, a previsão majoritária entre economistas é de que o juro ficará estável nos próximos três encontros do colegiado. Ou seja: entrará 2025 em dois dígitos.
Isso significa que a política monetária seguirá restritiva por mais tempo.
Em outras palavras, o juro tem que ficar mais alto para esfriar um pouco a economia e evitar mais inflação.
Na interpretação do BTG Pactual, por exemplo, o corte de juro não será assunto no BC antes de maio de 2025.
Por si só, este horizonte já desagrada empresários e governo porque inibe o empreendedorismo e a criação de empregos.
E frustra a expectativa anterior, de que a Selic poderia chegar em dezembro próxima de 9%. Ou até menos.
Copom: a visão sobre a Selic piorou
Contudo, mais do que a discussão específica sobre números, está a piora no tom das conversas de economistas sobre o que pode vir adiante.
De olho na questão fiscal, na troca de comando no BC e, mais recentemente, na disparada do dólar, os relatórios de bancos estão deixando de tratar de uma retomada de um ciclo de flexibilização monetária. Em vez disso, o assunto é: não vai ter aumento de juros. Pelo menos por enquanto.
“Neste momento, ainda não acreditamos que o BCB fará uma reversão e iniciará um ciclo de alta”, afirmaram Cassiana Fernandez e Vinicius Moreira, economistas do JPMorgan, em relatório da quarta-feira (24).
Pode parecer surpreendente. Mas o banco de investimentos norte-americano nem foi a primeiro a falar nesse tom.
No começo da semana, os economistas do Itaú Unibanco e do Bradesco comentaram atualizações de um modelo usado pelo BC para ajudar a tomar decisões sobre juros.
Resumidamente, ambas as casas concordaram que a escalada do dólar nos últimos meses não é motivo para alarme.
Dito de outra forma, o BC não vai subir a Selic para conter um repique na inflação provocado pela depreciação do real.
Em todos o casos, porém, ficou patente que o rumo da conversa mudou bastante.
Fiscal, câmbio e troca no BC: riscos no horizonte
Um observador atento pode questionar por que a percepção mudou tão rápido, uma vez que a inflação segue controlada.
De fato, a estimativa do mercado para o IPCA de 2024 está em torno de 4%. Embora esteja acima da meta de 3%, o índice está dentro da margem de tolerância, de até 4,5%.
Todavia, para decidir o que fazer com a Selic, o BC tem como parâmetro um horizonte mais longo, de um ano e meio.
E aí as perspectivas não são tão positivas.
Na comunicação com o mercado, o órgão tem manifestado crescente incômodo com os possíveis efeitos do aumento de gastos do governo na inflação futura.
Na reunião do Copom de maio, quando a Selic caiu pela última vez, “alguns membros” viram uma piora no chamado balanço de riscos para a inflação.
No mês passado, a “maioria” viu os riscos aumentando e, diferente do racha na reunião anterior, todos concordaram em estacionar a taxa básica em 10,5%.
Para o JPMorgan, portanto, o mais importante para a semana que vem não é a taxa em si, mas que sinais o comunicado que acompanha a decisão enviará.
“A opção da maioria sobre os riscos pode ser um prenúncio do que o BCB está inclinado a fazer nas próximas reuniões”, diz o relatório.
Sucessão no comando do BC
De certa forma, uma união dos diretores sobre o cenário pode ser um escudo contra o receio presente nos últimos meses: ingerência política.
O governo federal – crítico da política de juros do atual presidente do BC, Roberto Campos Neto – deve nomear nos próximos meses seu sucessor.
Isso porque o mandato de Campos Neto termina no fim de 2024.
Ele mesmo disse várias vezes que o receio de um sucessor mais alinhado com o governo, portanto mais tolerante com a inflação, é presente no mercado.
Neste sentido, o foco vem crescendo sobre Gabriel Galípolo, diretor de Política Monetária do BC, indicado pelo atual governo e apontado por muitos como favorito para suceder Campos Neto.
Nesta semana, Galípolo disse que o Banco Central entrou em um período de maior cautela, devido ao cenário econômico mais complexo no Brasil e no exterior.
Entre outros pontos, o diretor citou que questões fiscais têm gerado instabilidade no câmbio, numa visão mais alinhada com a de Campos Neto.
Para o investidor, uma sinalização de que o Copom está mais preocupado com o cenário pode ser interpretado como um risco maior de que a Selic vai subir.
Em princípio, esse cenário tenderia a beneficiar aplicações em títulos pós-fixados, enquanto os prefixados tendem a perder atratividade.
Ao mesmo tempo, o ânimo com ações de empresas mais ligadas a consumo ou aquelas cujo desempenho dependa de crédito, caso das construtoras, pode diminuir.
Na outra ponta, instituições financeiras com seguradoras poderiam ter maior atratividade, dado que elas costumam ter em carteira grande volume de títulos que rendem juros.