Mesmo que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) concedesse hoje a licença ambiental para perfurar na Bacia da Foz do Amazonas, no Amapá, a Petrobras só iniciaria a campanha exploratória no ano que vem, disse, nesta quinta-feira (24), Sylvia Anjos, diretora de exploração e produção da estatal.
Segundo ela, para a perfuração ser realizada, a sonda destinada para a atividade precisaria passar por um processo de limpeza do casco, o que demandaria cerca de dois meses. Além disso, o transporte para o poço demandaria mais 20 dias.
Anjos, que participou de aula aberta para alunos da Coppe/UFRJ, destacou que a empresa gastou “centenas de milhões de reais” entre a montagem de estruturas para cumprimento de exigências do Ibama e aluguel da sonda para perfuração, que tem custo estimado em US$ 600 mil por dia.
Ela contou que entre as exigências do órgão ambiental, estão a adequação do aeroporto de Oiapoque e a construção de centros de resgate de fauna, um em Belém e outro também no Oiapoque – este último como exigência recente após o Ibama considerar que o centro implantado na capital paraense está “distante” do local da perfuração.
“Vamos fazer tudo o que o Ibama pedir”, disse Anjos. Ela disse ainda que espera que os centros sejam “como o cemitério do Odorico Paraguaçu”, em alusão à novela “O Bem Amado”, de Dias Gomes. “Espero nunca precisar usar.”
Na história, o personagem principal, Odorico Paraguaçu, interpretado por Paulo Gracindo, tinha o objetivo de inaugurar um cemitério, mas não conseguia porque não havia mortes na cidade fictícia de Sucupira. Por isso, ele contratou o pistoleiro Zeca Diabo (Lima Duarte) para assassinar uma pessoa e assim inaugurar o cemitério.
A diretora de exploração e produção da buscará outras áreas no Brasil, como a Bacia de Pelotas – onde a companhia arrematou 29 blocos em leilão de petróleo no ano passado –, e vai buscar descobertas em outros países como alternativa. “Mas é muito duro ir para outros países tendo um potencial enorme aqui no Brasil”, afirmou.
E prosseguiu: “Descobertas nos [países] vizinhos são boas para os vizinhos. Quem vai operar na Margem Equatorial é uma empresa com capacidade e tecnologia.”
Para Anjos, a política ambiental deve ser adotada para que se façam projetos com responsabilidade – “não é para não fazer” – e destacou que o Ibama possui uma missão “hercúlea” em seu trabalho de fiscalizar e proteger o meio ambiente.
‘Fake news’ científico
Em sua apresentação, Anjos, que é geóloga de formação, destacou que a Petrobras já perfurou mais de 5,4 mil poços marinhos, sendo 3 mil em águas profundas, e que não é no momento da perfuração (uma das etapas da exploração de petróleo) que acontecem os acidentes com vazamentos, mas sim no transporte dos insumos.
Ela citou como exemplos o grande vazamento de óleo na Baía de Guanabara, nos anos 2000, e o derramamento de óleo em praias no Nordeste, em 2019.
A executiva aproveitou a aula aberta para afirmar que a Petrobras fez estudos que concluíram que as correntes marinhas no Amapá não são as que chegam à costa do Estado. E que não existem corais na Bacia da Foz do Amazonas. A ausência de estudos e a existência dos corais são considerados pontos sensíveis por ambientalistas da região e opositores ao projeto.
Segundo Anjos, corais naturais “não se criam” onde há lama fluvial, pois essas criaturas só sobrevivem em águas transparentes. O que existe na região, disse ela, são “rochas carbonáticas, antigas”. “Coral na Foz do Amazonas é ‘fake news’ científico”, afirmou.
Reposição de reservas
Sylvia Anjos observou que o foco da empresa no momento é a reposição de reservas de petróleo. Segundo a executiva, empresas que possuem relação entre reserva e produção que corresponda a sete anos tendem a ser compradas por outras petroleiras, já que não se viabilizam financeiramente.
Ela destacou que a chance de encontrar outro pré-sal, como o descoberto em 2006, é baixa e a empresa acredita que será mais fácil encontrar novas reservas de óleo no pós-sal, em águas menos profundas, como o que se espera na Margem Equatorial.
Dependência de petróleo
Na visão dela, o país pode voltar a ser importador de petróleo em 2034 ou 2035, caso a decisão seja de não explorar a Margem Equatorial, e perderá uma fonte importante de receita para a economia, considerando que não é a cadeia de óleo e gás a maior emissora de gases de efeito estufa, e sim as queimadas.
Ela observa que o Brasil continuará dependente do petróleo por causa da petroquímica e disse aos alunos da Coppe/UFRJ que “net zero” não é emissão zero de carbono, mas um balanço segundo o qual emissões e compensações resultam em resultado zero. “Se o Brasil parar de produzir petróleo, o mundo vai continuar produzindo e vamos continuar pobres.”
Usinas eólicas e solares
Anjos disse ainda que a empresa dedicou parte dos investimentos em projetos de energia renovável, vem cumprindo com a parte dela na descarbonização, mas ressaltou que investir na implantação de usinas eólicas e solares traz um retorno financeiro muito inferior ao obtido atualmente com as operações de petróleo.
“A remuneração de renováveis ainda não é a mesma de uma empresa de petróleo. Explorar [atividade de geração] eólica e solar talvez exija [a criação de] uma empresa à parte, disse a diretora de exploração e produção da Petrobras.
*Com informações do Valor Econômico