Blockchain entra no futuro documentado pelo Relatório Draghi. Isto é, no documento liderado pelo político italiano Mario Draghi para a União Europeia. Um documento que está recebendo atenção especial. Entidades financeiras, think tanks, fundações, etc. Eles têm convocado seus especialistas para dar um veredicto sobre o relatório. Sinais de reconhecimento de que este é um documento importante é que ele tem seu próprio nome em letras maiúsculas: Relatório Draghi.
O relatório pertence, por definição, a um gênero literário cinzento. Quando chega a um nome – seu principal autor ou promotor – que substitui o nome – também cinza – que costuma ostentar, já é um sintoma de sua relevância. Exemplos de relatórios com nomes em letras maiúsculas: Informe Beveridge, Informe Meadows, Informe MacBride, Informe Rockefeller.
Relatório Draghi e Blockchain
Draghi é um relatório que fala do futuro. Isso nos permite distinguir entre pelo menos dois tipos de futuro. O futuro imaginário, que sonhamos ou disputamos, que se encontra nas nossas conversas mais evanescentes ou na produção cultural da ficção. Um futuro que está na sala de estar ou nas salas de espetáculos.
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Depois há o futuro documentado, que, com bases técnicas, estabelece as pontes entre a descrição de um estado presente e as opções por onde caminhar. É um futuro que se situa numa encruzilhada e que exige tomar decisões e assumir compromissos. Pois bem, aí estaria também o futuro das empresas de Elon Musk: ele faz-nos ver como ninguém o futuro que os consumidores – especialmente a elite dos consumidores – querem dos seus produtos, com os seus designs e as suas campanhas. Mas este é outro tipo de futuro imaginário: o futuro imaginário produtivo.
O verdadeiro título do trabalho liderado pelo político italiano é “O futuro da competitividade europeia”. Deve-se admitir que é um título um tanto cinza. O relatório substantivo, que detalha detalhes e tenta ir além de um resumo executivo para a mídia, é a parte B, com o subtítulo: análise aprofundada e recomendações. Pois bem, num documento tão relevante onde o Blockchain está inserido.
Sistemas digitais descentralizados
A referência ao Blockchain no Relatório Draghi encontra-se em dois pontos-chave. Por um lado, na descrição do impulso dado pela China a certas tecnologias que o relatório chama de tecnologias de fronteira. Blockchain aparece ao lado: desenvolvimentos em edição de genoma, visão computacional, armazenamento de hidrogênio e veículos autônomos. No entanto, a qualidade dos resultados de tal impulso é qualificada por comentários derivados da análise de patentes que o relatório traz. Por outro lado, e apesar desta nuance das conquistas chinesas, o Blockchain surge como um campo integrado no poço das fragilidades europeias nas tecnologias digitais, juntamente com a IA (inteligência artificial), a IoT (internet das coisas), a cibersegurança e a computação quântica.
Noutras partes do documento é feita referência a sistemas digitais descentralizados. Referências sempre em forma de recomendações. Mas o que foi dito é suficiente.
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Síntese: Blockchain como tecnologia de fronteira da qual os europeus estão bastante distantes. As tecnologias de fronteira são as mais avançadas e deverão transformar indústrias, economias e sociedades. Tecnologias às quais se atribui um enorme potencial. Com capacidade de criar novos hábitos e novos mercados. Tecnologias disruptivas e, ao mesmo tempo, consideradas essenciais para enfrentar os maiores desafios e problemas, como a pobreza global, as doenças ou as alterações climáticas.
Como tecnologia de fronteira, o Blockchain está ao lado da inteligência artificial, da computação quântica ou da edição genética. Como tecnologia de fronteira, está tanto no futuro imaginário como no futuro documentado. O seu próprio estado fronteiriço – entre o que é e o que pode ser – é o que lhe dá força. Um estado onde há espaço para a imaginação desenvolver tecnologia e onde a imaginação é projetada com aplicações futuras reais. As tecnologias de fronteira são aquelas que colonizam o futuro. É impressionante como, para confrontar uma concepção tão temporal como o futuro, são necessárias tantas metáforas que nos falem sobre o espaço.
Blockchain na Europa
O Relatório Draghi parece destinado a durar. O seu eco está a ser generalizado e temo que se torne uma referência. Pelo menos sempre que forem publicados dados sobre a enfraquecida competitividade europeia. Assim, analisaremos o desenvolvimento diferencial do Blockchain na Europa, em relação a outras partes do planeta. E questionar-nos-emos se algumas políticas europeias estão a promover ou a travar o desenvolvimento e a aplicação desta tecnologia. E veremos, como Europeus, se estamos mais perto ou mais longe da fronteira que conduz à colonização do futuro.
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O documento estará lá, como algo vivo. Isso já é muito para um relatório. Abundam os exemplos em contrário. Ele Relatório 2050elaborado pelo Gabinete de Prospectiva do Ministério da Presidência de Espanha, mal existe há alguns meses desde que foi elaborado e os seus patrocinadores perceberam que era mais uma fonte de ruído do que um guia.
Um documento que coloca como objectivo principal o aumento da produtividade não parece estar entre as bases das decisões e propostas do actual Governo. E, face aos fardos peremptórios e pesados da política do presente, o futuro torna-se um fardo tremendo. A propósito, duas coisas sobre este documento e o departamento que o produziu. Um: o nome que este relatório adquiriu quando foi apresentado foi Relatório 02050. Agora sabemos o significado do zero inicial. Dois: a única produção pública relevante deste Prospectivo é um livro com vários narradores – romancistas, principalmente – falando sobre o futuro. Talvez outro sinal com seu significado. E daí? Relatório 2050 Era também um futuro imaginário.